20/10/2023

Bebei da Fonte

 Élder Bruce R. McConkie

 

Discurso proferido na conferência geral da Sociedade de Socorro, em 2 de outubro de 1974.


Tomarei como texto as palavras do Senhor Jesus: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para vossas almas. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve.” (Mateus 11:28-30.) Chamarei a atenção para três expressões: “Vinde a mim”, “Aprendei de mim”, e “Achareis descanso para vossas almas” .

Gostaríamos de que todos os santos dos últimos dias lessem todas as obras--padrão, ponderassem todas as verdades eternas nelas encontradas, se ajoelhassem e pedissem ao Senhor entendimento, compreensão e orientação, com toda sinceridade e fé.

Gostaríamos de que todos vós as lêsseis, mas não simplesmente isso, que, além das palavras, ponderásseis e orásseis a respeito de seu conteúdo, a fim de que a vosso coração adviessem os desejos de justiça que emanam do estudo da palavra pura e perfeita de Deus. Gostaríamos de que a Igreja começasse bebendo da fonte — não diluída — a mensagem pura, perfeita, que o Senhor transmitiu pela boca dos profetas, a mensagem encontrada nas obras-padrão da Igreja.

Segundo entendo, parece-me importantíssimo que estudemos os quatro evangelhos, Mateus, Marcos, Lucas e João, porque são o registro da vida do Senhor. Aqui, acima de qualquer outro lugar, podemos cumprir a instrução “aprendei de mim”. Aqui é a fonte onde começaremos a amar o Senhor; e os que amam o Senhor, evidenciam-no por guardar seus mandamentos; e os que guardam os mandamentos ganham vida eterna em seu reino.

Queremos ter paz, alegria e felicidade nesta vida, e ser herdeiros de vida eterna no mundo vindouro. Essas são as duas maiores bênçãos possíveis às pessoas. Poderemos recebê-las lendo e aprendendo as palavras de vida eterna, aqui e agora, e guardando os mandamentos, que nos preparam para a glória imortal no mundo futuro.

Falemos agora, particularmente, destes extraordinários livros que denominamos os quatro evangelhos. Eles contêm tesouros ocultos e desconhecidos. Ainda não compreendemos tudo o que podemos aprender com os quatro evangelhos. Surpreender-vos-íeis se eu vos dissesse que há mais conhecimento contido nos quatro evangelhos, mais verdade revelada concernente à natureza e espécie de ser que Deus, nosso Pai é, do que em todo o restante das sagradas escrituras somado? Tudo o de que precisamos é aprender como extrair tal conhecimento. Precisamos de orientação. Precisamos de que o Espírito do Senhor nos dirija, enquanto estudamos.

Lembrai-vos de que Filipe encontrou o eunuco da corte de Candace. O eunuco lia profecias messiânicas no livro de Isaías. Perguntou-lhe Filipe: “Entendes, porventura, o que estás lendo?” E ele respondeu: “Pois como poderei entender, se alguém não me ensinar?” (Atos 8:26-31.) Precisamos ser ensinados quanto à maneira de abordar as escrituras da Igreja, e então, caso sigamos fórmulas simples que nos são apresentadas, teremos nova visão de entendimento doutrinário, e um renovado desejo de viver retamente brotará em nosso coração.

Consideremos os evangelhos. São o relato da vida do Senhor. Os evangelhos falam dele. Ele é o Filho de Deus. Deus, em Cristo, manifestava ao mundo a natureza e o tipo de ser que ele é. E conhecer o Pai e o Filho, e tornar-se como eles é vida eterna. Conheceremos o Pai ao chegarmos a um entendimento do Filho. O Filho é o revelador de Deus. Ninguém chega até o Pai, a não ser por ele ou por sua palavra. (João 14:6.) Queremos conhecer o Pai e o Filho, e o registro principal encontra-se nos evangelhos.

Surpreender-vos-íeis, também, se vos dissesse que há mais conhecimento e doutrina a respeito do sacrifício expiatório de Jesus nos quatro evangelhos, do que em qualquer outro lugar nas obras-padrão? Tudo o de que precisamos é a chave para abrir esse conhecimento. Podemos saber, com absoluta certeza, o modo como ele proclama sua filiação divina.

Por exemplo, existe um relato no qual ele cura um homem que nascera cego. Ele opera esta cura sem que lhe peçam. Ele faz isso a fim de reunir uma congregação. O fato é anunciado em toda Jerusalém. As multidões se achegam para ver o que ocorrera. E então, ele começa a ensinar àquela multidão: “Eu sou o bom pastor”, ou seja: “Eu sou o Senhor, Jeová.” No sermão ele diz: “Eu e meu Pai somos um.” Ele pronuncia um glorioso discurso sobre o fato de que é o Filho de Deus. E se crê em suas palavras porque ele abriu os olhos de um homem que viera ao mundo cego! (Ver João 9 e 10.)

 

The Good Shepherd, by Del Parson

 

A mesma ilustração ocorre quando trouxe Lázaro de volta dos mortos. Jesus vem e prega um sermão: “Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em mim, ainda que esteja morto viverá; e todo aquele que vive, e crê em mim, jamais morrerá.” (João 11:25-26.) Em outras palavras, o que ele diz é: “A imortalidade vem através de mim; a vida eterna é em mim e por mim. Eu sou Filho de Deus. Eu torno possíveis tais coisas.” E para que não pairem dúvidas sobre esta doutrina, ele ordena que removam a pedra da porta do túmulo, e então fala: “Lázaro, vem para fora!” (João 11:43.) Ante tal ordem, o homem cujo corpo já começava a decompor-se, levanta-se e sai. Levantar Lázaro de entre os mortos é também um testemunho, para todo o mundo e por todas as eternidades, de que o homem que operou, isto é, a ressurreição e a vida; que a imortalidade e a vida eterna vêm através dele; e que ele é o Filho do Deus vivente. (João 11.)

Tomemos outra ilustração: após a ressurreição, Jesus segue pelo caminho de Emaús, conversando com dois de seus discípulos. Ao partir do pão, ele se lhes torna conhecido. Pouco depois ele aparece numa sala superior a dez dos doze (Tomé estava ausente) — e, notai, era junto a uma congregação de santos, que, sem dúvida, incluía as irmãs fiéis da época — e a todo esse grupo, não somente aos dez, mas a todos, ele diz: “Tendes aqui alguma coisa que comer?” (Lucas 24:41.)

Trouxeram-lhe um pedaço de peixe assado e um favo de mel, e ele os comeu diante deles. Então puderam sentir as marcas dos cravos nas mãos e nos pés, e puderam tocar-lhe o lado. Falai de uma ocasião de ensino. Este episódio ocorrido em Emaús, e que teve seu clímax na sala superior é a ilustração suprema de todas as revelações jamais dadas, acerca de como é um ser ressuscitado, e de como nós, seguindo o mesmo padrão, iremos tornar-nos, se formos verdadeiros e fiéis em todas as coisas. (Lucas 24.)

Minha sugestão é de que temos uma oportunidade maravilhosa de aprender a amar o Senhor e obter o desejo de guardar seus mandamentos e herdar paz nesta vida e vida eterna no mundo vindouro. Não é só ler: é ler, ponderar e orar para que o Espírito do Todo- -Poderoso se envolva nesse estudo e nos dê o entendimento.

Há alguns anos dediquei intensa atenção aos quatro evangelhos, conforme estão no Novo Testamento.

Ao terminar esse estudo, e usando as palavras de João como texto — “estes, porém, estão escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome”. (João 20:31) — escrevi o seguinte:

“Encerram-se, assim, os evangelhos — “Sagrados escritos que narram o nascimento, ministério, missão, sacrifício expiatório, ressurreição e ascensão do Filho de Deus;

“Os registros revelados que ensinam com poder e convicção as verdades eternas em que devem os homens crer a fim de ganhar salvação no reino de Deus;

“As histórias verdadeiras da vida de Cristo, que conduzem os homens a amar o Senhor e guardar seus mandamentos;

“Aqueles testemunhos sagrados e solenes que abrem a porta à paz nesta vida e vida eterna no mundo vindouro.

“Nestes sagrados registros evangélicos, nestes testemunhos da vida de nosso Senhor —

“Vemos Jesus — o Todo-Poderoso, o Criador de todas as coisas desde o princípio — recebendo um tabernáculo de barro (ver Mosiah 3:5) nas entranhas de Maria.

“Quedamo-nos junto ao Infante na manjedoura e ouvimos vozes celestiais saudando seu nascimento.

“Observamo-lo ensinando no templo e confundindo os sábios do mundo com apenas doze anos de idade.

“Podemos vê-lo nas águas do Rio Jordão, submerso pela mão de João, enquanto se abrem os céus e o personagem do Espírito Santo desce como uma pomba; e ouvimos a voz do Pai pronunciando palavras de aprovação.

“Acompanhamo-lo a um lugar deserto, e eis que vem o diabo, tentador, envolvente, buscando afastá-lo do caminho traçado por Deus.

“Admirados e surpresos vemos os milagres: ele fala e o cego vê; a um toque seu os surdos ouvem; ele ordena, e os coxos saltam, paralíticos se levantam--se da cama, leprosos tornam-se limpos, e os demônios desertam para suas soturnas habitações.

“Regozijamo-nos ao ver almas tolhidas pelo pecado serem renovadas, ao ver discípulos abandonarem tudo para segui-lo, ao ver santos nascerem de novo.

“Ficamos estupefatos de como os elementos obedecem a sua voz: ele caminha sobre a água; a tormenta cessa ao seu mandar; amaldiçoa a figueira, e ela seca; a água torna-se vinho por sua vontade; uns poucos peixes e pães alimentam milhares, em virtude de sua palavra.

“Assentamo-nos com o Senhor da vida, como homem, na intimidade de um círculo familiar em Betânia; choramos com ele junto ao túmulo de Lázaro; jejuam os e oramos a seu lado quando comungou com o Pai; comemos, dormimos e andamos em sua companhia pelos caminhos e vilarejos da Palestina; vimo-lo faminto, sedento, cansado, e maravilhamo-nos ao ver um Deus procurar essas experiências mortais.

“Saciamo-nos em seus ensinamentos; ouvimos parábolas tais como o homem nunca pronunciara antes; aprendemos o que significa alguém, com autoridade, anunciar a doutrina de seu Pai.

“Vemo-lo:

“Na dor — chorando por seus amigos, lamentando-se sobre a Jerusalém condenada;

“Na compaixão — perdoando pecados, cuidando de sua mãe, curando os homens, física e espiritualmente;

“Na ira — limpando a casa de seu Pai, protestando com justa indignação ante sua profanação;

“No triunfo — entrando em Jerusalém em meio a brados de Hosana ao Filho de Davi, transfigurado diante de seus discípulos sobre o monte, e postado em glória de ser ressuscitado sobre uma montanha da Galileia.

“Inclinamo-nos junto a ele em uma sala superior, apartados do mundo, e ouvimos alguns dos maiores sermões de todos os tempos, ao partilharmos dos emblemas de sua carne e sangue.

“Oramos com ele no Getsêmani, e trememos ante o peso do fardo por ele suportado, enquanto grandes gotas de sangue brotavam de todos os poros; curvamos a cabeça, envergonhados, enquanto Judas dava o ósculo da traição.

“A seu lado nos postamos, diante de Anás, e de Caifás; acompanhamo-lo até Pilatos, e depois Herodes, e de volta a Pilatos; partilhamos da dor, sentimos os insultos, horrorizamo-nos com a mofa, e revoltamo-nos com a grande injustiça e a histeria do povo que, clamando, o conduziu inevitavelmente à cruz.

“Lamentamos juntam ente com sua Mãe e outros, ao pé do Gólgota, enquanto os soldados romanos pregavam cravos em suas mãos e pés; arrepiamo-nos ao ver a lança perfurar lhe o lado, e vivemos, com ele o momento em que, voluntariamente, entregou a vida.

“Estamos no jardim quando os anjos rolam a pedra, e ele sai em gloriosa imortalidade; caminhamos a seu lado pela estrada de Emaús; ajoelhamo-nos na sala superior, sentimos as marcas dos cravos nas mãos e nos pés, e metemos a mão em seu lado; com Tomé, exclamamos: ‘Senhor meu, e Deus m eu!’ (João 20:28.)

“Andamos até Betânia, e eis que, ladeado de anjos, ascende para estar com o Pai; e nossa alegria é plena, porque vimos Deus com o homem.

“Vemos Deus nele — porque sabemos que Deus estava em Cristo, manifestando-se ao mundo, para que todos os homens conhecessem esses seres sagrados, a quem conhecer representa vida eterna.

“O que diremos mais de Cristo? De quem é Filho? Que obras operou? Quem, hoje, pode testificar de tais coisas?

“Que se escreva uma vez mais — e é o testemunho dos profetas de todas as épocas — que ele é o Filho de Deus, o Unigênito do Pai, o Messias Prometido, o Deus de Israel, nosso Redentor e Salvador; que ele veio ao mundo para manifestar o Pai, revelar outra vez o evangelho, ser nosso grande Exemplo, efetuar o sacrifício expiatório, eterno e infinito; e que logo ele retornará para reinar pessoalmente na terra e salvar e redimir aqueles que o amam e o servem.

“E que seja também escrito, tanto na terra como nos céus, que eu também sei da verdade dessas coisas a respeito das quais os profetas testificaram. Pois que tais coisas me foram reveladas pelo Santo Espírito de Deus, e eu, portanto, testifico que Jesus é o Senhor de tudo, o Filho de Deus, pelo qual vem a salvação.”

(Bruce R. McConkie, Doctrinal New Testament Commentary, vol. 1, pp. 873-876.)

 

Gustave Dore - Burial of Jesus

 

Ora, o que há de portentoso no sistema de religião revelada que Deus nos deu hoje é: primeiro, que é verdadeiro; segundo, que todo homem, mulher e criança na Igreja pode ter o conhecimento absoluto, nascido do Espírito, a convicção plena e inabalável de que Jesus é o Senhor; que a salvação está em Cristo; que se nos aproximarmos dele, e aprendermos dele, e guardarmos seus mandamentos, teremos paz, alegria e felicidade nesta vida, e seremos herdeiros da vida eterna.

Lançamos o desafio a todos na Igreja que bebam da fonte, a mensagem pura do Senhor; que estudem as obras-padrão da Igreja; que leiam, ponderem e orem; que peçam a Deus o entendimento; que obtenham o poder do Santo Espírito, a fim de que cada pessoa saiba, independentemente de qualquer outra, a veracidade e divindade dessas coisas, porque é a partir delas que advém a alegria, satisfação e paz que o evangelho oferece.

Deus permita que assim seja. Esta obra é verdadeira. Esta é a obra do Senhor. Sua mão a opera. Ele já decretou seu sucesso. Ela irá avante, e vós e eu herdaremos, na eternidade, essas gloriosas bênçãos, se agora fizermos as coisas que, estou certo, todos sabemos que devemos fazer.

Em nome do Senhor, Jesus Cristo, amém.

Tradutor