16/09/2016

A Obra Missionária e a Expiação

Élder Jeffrey R. Holland.
Do Quórum dos Doze Apóstolos

O Profeta Joseph Smith certa vez declarou que todas as coisas pertencentes “à Nossa religião são meros complementos [da Expiação de Jesus Cristo]”. 1 De modo análogo e pelos mesmos motivos, todas as verdades que os missionários ou membros ensinam são apenas adendos da mensagem mais importante de todos os tempos: Jesus é o Cristo, o Salvador e Redentor do mundo.

Nossa mensagem central é que, ao ofertar integralmente Seu corpo, Seu sangue e a angústia de Seu espírito, Cristo expiou a transgressão inicial de Adão e Eva no Jardim do Éden e também os pecados pessoais de todas as demais pessoas que viveriam neste mundo desde Adão até o fim dos tempos.


Fonte: http://www.reflectionsofchrist.org


Algumas dessas bênçãos, como o dom da Ressurreição, são gratuitas. Já outras são condicionais e exigem a obediência aos mandamentos, à realização de ordenanças e uma vida pautada pelos princípios esperados de um discípulo de Cristo.

De qualquer forma, a mensagem essencial do evangelho é esta, expressa pelo próprio Mestre: “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim”. 2 Assim, a Expiação de Cristo, que possibilita nosso regresso à presença do Pai, é o fato crucial, o alicerce e a doutrina principal do grande e eterno plano de salvação, plano esse que fomos chamados a ensinar.

REQUISITOS PARA O BATISMO

Creio haver pouquíssimos missionários, se é que os há, que não tenham ciência da importância vital dessa doutrina. Mas causa-me espanto verificar que não se trata de algo mencionado com a devida frequência nas discussões sobre a obra missionária. Um exemplo é o tipo de resposta que ouço nas conferências de zona quando pergunto aos missionários o que desejam que os pesquisadores façam ao ouvirem as palestras.

“Que se batizem!” é o que eles costumam bradar em uníssono.

“Certamente”, respondo. “Mas o que precisa acontecer antes disso?”

Nesse momento, eles ficam um pouco reticentes. Ah, ele deve nos estar testando, pensam. Um teste sobre a primeira palestra. “Eles precisam ler o Livro de Mórmon!” responde alguém. “Orar!” exclama outro Élder. “Ir à Igreja!” menciona uma missionária. “Receber todas as palestras!” declara outro missionário.

“Bem, vocês enumeraram praticamente todos os compromissos da primeira palestra”, digo. “Mas o que mais vocês querem que seus pesquisadores façam?”

“Que se batizem!” repetem os missionários em coro.

“Élderes” e “Sísters” prossigo, “vocês já me falaram acerca do batismo, mas ainda não ouvi a resposta que estou esperando!”.

Bem, nesse ponto eles ficam perplexos. Deve tratar-se de compromissos de outras palestras, presumem. “Obedecer à Palavra de Sabedoria!”, propõe alguém. “Pagar o dízimo!” grita outro. E assim continuam.

Devo admitir que raramente os missionários apontam as duas coisas fundamentais que desejamos que os pesquisadores façam antes do batismo: ter fé no Senhor Jesus Cristo e arrepender-se de seus pecados. Contudo, “cremos que os primeiros princípios e ordenanças do evangelho são: primeiro, Fé no Senhor Jesus Cristo; segundo, Arrependimento; terceiro, Batismo por imersão para remissão de pecados; quarto, Imposição de mãos para o dom do Espírito Santo”.3

A nova vida do converso deve alicerçar-se na fé no Senhor Jesus Cristo e Seu sacrifício redentor — uma convicção de que Ele é verdadeiramente o Filho de Deus, de que Ele está vivo agora, de que só Ele possui a chave para nossa salvação e exaltação. E essa crença deve vir acompanhada do verdadeiro arrependimento, que é a demonstração de nosso desejo de tornarmo-nos puros e permite o acesso irrestrito à plenitude das bênçãos da Expiação.

Só então entra em cena o batismo para a remissão dos pecados. Sim, é verdade que o batismo também é a forma de ingresso na Igreja, mas não é esse aspecto que o Profeta Joseph Smith frisou naquela regra de fé. Salientou que o batismo é para a remissão dos pecados — chamando assim a nossa atenção, a dos missionários e a dos pesquisadores para a Expiação, para a salvação, para o dom que Cristo nos concede. 

Fonte: http://www.reflectionsofchrist.org

TORNAR A EXPIAÇÃO ALGO CENTRAL NA OBRA MISSIONÁRIA

Eu gostaria de sugerir algumas coisas que todos podemos fazer para que Cristo e Sua Expiação ocupem na mente dos membros e pesquisadores a posição de destaque que merecem.

Estimulem de todas as maneiras possíveis, reuniões sacramentais. Os pesquisadores têm o direito de sentir nessa ocasião o mesmo Espírito que os toca quando ouvem as palestras dos missionários.

Ajudem na preparação dos pesquisadores explicando com antecedência a ordenança do sacramento. Os missionários podem ler para eles as orações sacramentais que se encontram nas escrituras, ler a letra de alguns de seus hinos sacramentais prediletos ou tomar outras providências que ajudem esses visitantes a terem uma experiência de aprendizado memorável ao participarem da reunião sacramental.

Da mesma forma, façam tudo a seu alcance para tornar as reuniões batismais uma experiência espiritual e centralizada em Cristo. Os recém-conversos merecem que esse seja um momento sagrado, cuidadosamente planejado e espiritualmente edificante. As orações, os hinos e certamente os discursos, tudo deve estar em harmonia com o significado do batismo e da Expiação de Cristo, que torna essa ordenança válida. Missionários, não se deixem levar tanto pela ânsia de registrar um batismo a ponto de esquecerem o que representa essa ordenança e o que deve significar na vida do novo membro.

Ao longo de todo o processo de ensino, os missionários devem prestar testemunho do Salvador e de Seu dom da salvação para a humanidade. É claro que é preciso testificar regularmente de todos os princípios ensinados, mas é de fundamental importância prestar testemunho dessa doutrina que constitui a essência do plano de nosso Pai Celestial.

Há vários motivos para prestar testemunho. E um deles é que quando declaramos a verdade, ela ecoa na mente dos pesquisadores como algo familiar, uma lembrança inconsciente de algo que parecem já ter ouvido antes — e é claro que ouviram. O testemunho do missionário evoca um grande legado de testemunho que teve origem nos conselhos celestiais realizados antes da fundação do mundo. Naquela época, essas pessoas ouviram esse mesmo plano ser exposto e tomaram conhecimento do papel que Jesus Cristo desempenharia em sua salvação.

O cerne da questão é que os pesquisadores não estão ouvindo apenas nosso testemunho de Cristo, mas escutando ecos de outros testemunhos anteriores, inclusive o que eles próprios prestaram, pois eles estavam do lado os fiéis que guardaram o primeiro estado e conquistaram o privilégio de um segundo. Devemos sempre lembrar que esses pesquisadores estavam entre os valentes que outrora derrotaram Satanás pelo poder de seu testemunho de Cristo!4

Além do mais, ao testificarem de “Jesus Cristo, e este crucificado”5 — usando as palavras de Paulo — vocês invocam o poder de Deus o Pai e do Espírito Santo. O próprio Salvador ensinou:

“Todo aquele que crê em mim, crê também no Pai; e a ele [o pesquisador] o Pai dará testemunho de mim, pois visitá-lo-á [o pesquisador] com fogo e com o Espírito Santo.

E assim o Pai dará testemunho de mim e o Espírito Santo dará testemunho do Pai e de mim; pois o Pai e eu e o Espírito Santo somos um. (. . .)

(. . .) Esta é minha doutrina e os que edificam sobre isto edificam sobre minha rocha; e as portas do inferno não prevalecerão contra eles.”6

Então por que devemos prestar testemunho de Cristo com frequência e poder? Porque ao fazê-lo, convidamos o Espírito e nosso testemunho passa a integrar o poder divino que emana de Deus o Pai e do Espírito Santo, um testemunho prestado com o fogo do Espírito e que toca o coração dos pesquisadores. Esse testemunho divino de Cristo é a rocha sobre a qual cada recém-converso deve edificar. Somente esse testemunho do Ungido prevalecerá contra as portas do inferno.

Estudem as escrituras diligentemente e familiarizem-se com as passagens que ensinem e testifiquem da missão redentora de Cristo. Nada tocará seu coração e sua alma como as verdades que mencionei até agora.

Pediria em especial aos missionários de tempo integral e membros missionários que estudem e ensinem a Expiação de Cristo conforme registrada no Livro de Mórmon. Digo isso com fervor especial, pois em minha missão aprendi a amar o Livro de Mórmon e a magnificência do Filho de Deus revelada por ele. Em sua ênfase ímpar no Salvador do mundo, o Livro de Mórmon é literalmente um novo testamento ou “outro testamento” de Jesus Cristo, declarando a todos que, por meio da Expiação do Filho de Deus, “assim como [caíram], [serão redimidos] (. . .), sim, tantos quantos o desejarem”.7

TESTEMUNHO DE PROFETAS DO LIVRO DE MÓRMON

Vejamos as seguintes palavras de Néfi, proferidas no início de seu ministério:

“E o mundo, devido à iniquidade, julgá-lo-á como uma coisa sem valor; portanto o açoitam e ele suporta-o; e ferem-no e ele suporta-o. Sim, cospem nele e ele suporta-o por causa de sua amorosa bondade e longanimidade para com os filhos dos homens.

E o Deus de nossos pais, (. . .) sim, o Deus de Abraão e de Isaque e o Deus de Jacó, como homem, entregar-se- á (. . .) nas mãos de iníquos para ser levantado, de acordo com as palavras de Zenoque; e para ser crucificado, de acordo com as palavras de Neum; e para ser enterrado num sepulcro, de acordo com as palavras de Zenos.

(. . .) E todas estas coisas certamente se darão, diz o profeta Zenos. E partir-se-ão as rochas da Terra e, por causa dos gemidos da Terra, muitos dos reis das ilhas do mar serão inspirados pelo Espírito de Deus a exclamar: O Deus da natureza sofre.” 8

Ou vejamos o que declarou Jacó, o notável irmão de Néfi, que fez um sermão de dois dias sobre a Queda e a Expiação!

“Oh! Quão grande é a bondade de nosso Deus, que prepara um caminho para nossa fuga das garras desse terrível monstro, sim, aquele monstro, morte e inferno, que eu chamo morte do corpo e também morte do espírito. (. . .)

E ele vem ao mundo para salvar todos os homens, se eles derem ouvidos a sua voz; pois eis que ele sofre as dores dos homens, sim, as dores de toda criatura vivente, tanto homens como mulheres e crianças, que pertencem à família de Adão.

E ele sofre isto para que todos os homens ressuscitem. (. . .)

E ordena a todos os homens que se arrependam e sejam batizados em seu nome, tendo perfeita fé no Santo de Israel, pois do contrário não poderão ser salvos no reino de Deus.”9

Como último exemplo, vejamos as seguintes palavras do grande patriarca Leí:

“Portanto a redenção nos vem por intermédio do Santo Messias. (. . .)

Eis que ele se oferece em sacrifício pelo pecado, cumprindo, assim, todos os requisitos da lei para todos os quebrantados de coração e contritos de espírito; e para ninguém mais podem todos os requisitos da lei ser cumpridos.

Portanto, quão importante é tornar estas coisas conhecidas dos habitantes da Terra, para que saibam que nenhuma carne pode habitar na presença de Deus a menos que seja por meio dos méritos e misericórdia e graça do Santo Messias, que dá a sua vida, segundo a carne, e toma-a novamente pelo poder do Espírito, para poder efetuar a ressurreição dos mortos, sendo ele o primeiro a ressuscitar.

Ele é, portanto, as primícias para Deus, visto que intercederá por todos os filhos dos homens; e os que nele crerem serão salvos.”10

Obviamente, vocês reconhecem que esses trechos são todos testemunhos que se encontram nas páginas iniciais do Livro de Mórmon. Talvez isso já seja o suficiente para ajudá-los a compreender o tema urgente e grandioso que permeia todo esse registro sagrado. O Livro de Mórmon foi a primeira ferramenta missionária desta dispensação — e ainda é a mais eficaz.

Testifico lhes que transformaremos a vida de muitos, incluindo a nossa própria, se ensinarmos a Expiação por meio do Livro de Mórmon bem como de outras escrituras.

A EXPIAÇÃO E OS MISSIONÁRIOS

Qualquer pessoa que realiza algum tipo de obra missionária em um momento ou outro certamente já se perguntou: Por que é tão difícil? Por que não temos sucesso mais rápido? Por que mais pessoas não se filiam à Igreja? Não seria tão mais fácil se o único risco para os missionários fosse contrair pneumonia depois de passarem dia e noite encharcados na pia batismal?

Já pensei muito nisso. Gostaria de expressar minha opinião pessoal: estou convencido de que a obra missionária não é fácil porque a salvação tampouco o é; não se trata de uma experiência corriqueira. A salvação nunca foi fácil. Somos a Igreja de Jesus Cristo, esta é a verdade, e Ele é nosso Grande e Eterno Líder. Como haveríamos de achar que seria fácil para nós se jamais foi fácil para Ele? Parece-me que os missionários e líderes de missão precisam passar pelo menos alguns instantes no Getsêmani. Devem dar ao menos alguns passos rumo ao Calvário.

Mas rogo-lhes que não me interpretem mal. Com isso não quero dizer que possamos vivenciar algo que chegue ao menos perto do que Cristo padeceu. Seria presunçoso e blasfemo. Mas creio que os missionários e pesquisadores, para chegarem à verdade e à salvação, para terem alguma noção do preço pago por Ele, terão de pagar ainda que uma ínfima porção desse mesmo preço.

Por isso, acho que a obra missionária nunca foi fácil, tampouco a conversão, a retenção ou a fidelidade contínua. A meu ver, sempre se exige algum esforço, algo que parta das profundezas da alma.

Se Ele teve, naquela noite, de ajoelhar-Se, prostrar-Se, sangrar por todos os poros e exclamar: “Aba, Pai, todas as coisas te são possíveis, afasta de mim este cálice”11, não é de admirar que a salvação também não seja fácil para nós. Se vocês desejam saber se acaso não haveria um caminho mais fácil, lembrem que não são os primeiros a fazerem tal indagação. Alguém muito maior e mais digno perguntou há muito tempo se não haveria uma maneira menos dolorosa.

Quando vocês estiverem em dificuldades, quando se sentirem rejeitados, quando forem humilhados e expulsos, estarão em situação semelhante à da melhor vida que este mundo já conheceu, a única vida perfeita que já houve. Vocês têm todos os motivos para andarem de cabeça erguida e serem gratos pelo fato de o Filho vivo do Deus vivo conhecer todas as suas dores e aflições. A única senda que conduz à salvação passa necessariamente pelo Getsêmani e pelo Calvário. O único caminho para a eternidade é por meio Dele: o Caminho, a Verdade e a Vida.

Testifico que o Deus vivo é nosso Pai Celestial e que Jesus Cristo é Seu Filho vivo e Unigênito na carne. Testifico que esse Jesus, que foi morto e suspenso no madeiro12, vive. O total triunfo do evangelho é que Ele vive e, porque vive, nós também viveremos.

Naquele primeiro domingo de Ressurreição, Maria Madalena achou, a princípio, ter visto um jardineiro. De fato, viu mesmo — o Jardineiro que cultivou o Éden e que suportou as dores do Getsêmani. O Jardineiro que nos concedeu a árvore da vida.

Declaro que Ele é o Salvador do mundo. Sei que somos elevados para a vida porque Ele foi elevado para a morte. Testifico que Ele foi ferido por nossas transgressões e moído por nossas iniquidades, que foi um varão de dores e experimentado em padecimentos e tomou sobre Si as transgressões de todos nós.13

Presto testemunho de que, na condição de Deus, Ele saiu da presença de Deus para restaurar os contritos de coração, enxugar as lágrimas de todo olho, proclamar liberdade aos cativos e abrir as portas da prisão aos encarcerados. 14 Prometo-lhe que, se forem fiéis ao atenderem ao chamado de proclamar o evangelho, Ele curará seu coração atormentado, secará suas lágrimas e libertará vocês e sua família. Esta é a promessa missionária que lhes deixo e a mensagem missionária que exorto que levem ao mundo.

Discurso proferido no Centro de Treinamento Missionário (CTM) de Provo em 20 de junho de 2000.

NOTAS

1. Ver Ensinamentos do Profeta Joseph Smith, sel. por Joseph Fielding Smith (1976), p. 118.

2. João 14:6.

3. Regras de Fé 1:4; grifo do autor.

4. Ver Apocalipse 12:10–11.

5. I Coríntios 2:2.

6. 3 Néfi 11:35–36, 39; grifo do autor.

7. Moisés 5:9.

8. 1 Néfi 19:9–10, 12.

9. 2 Néfi 9:10, 21–23.

10. 2 Néfi 2:6–9; grifo do autor.

11. Ver Marcos 14:36.

12. Ver Atos 5:30.

13. Ver Isaías 53; Mosias

14. Ver Isaías 61:1–3.