23/11/2016

A Corrida da Vida

Presidente Thomas S. Monson

De onde viemos? Por que estamos aqui? Para onde iremos quando partirmos desta vida? Essas perguntas universais não precisam mais ficar sem respostas.

Amados irmãos e irmãs, nesta sessão desejo falar-lhes sobre verdades eternas; verdades que enriquecerão nossa vida e nos levarão em segurança ao nosso lar.

Em toda parte, as pessoas estão com pressa. Aviões a jato transportam sua preciosa carga humana através de imensos continentes e vastos oceanos para que reuniões de negócios sejam realizadas, obrigações sejam cumpridas, férias sejam desfrutadas ou parentes sejam visitados. Em toda parte há rodovias — vias expressas, autopistas e autoestradas — nas quais trafegam milhões de automóveis, levando milhões de pessoas num fluxo aparentemente interminável, por uma infinidade de motivos em nossa corrida diária.
Nesse ritmo frenético da vida, será que fazemos uma pausa para alguns momentos de meditação, sim, para pensar nas verdades eternas?



Comparadas às verdades eternas, a maioria das questões e preocupações cotidianas são realmente bem triviais. O que teremos para o jantar? Qual cor devemos usar para pintar a sala? Será que devemos inscrever o Joãozinho no futebol? Essas questões e muitas outras semelhantes perdem seu significado quando surge uma crise, quando nossos entes queridos são feridos ou magoados, quando a doença acomete os saudáveis, quando a chama da vida enfraquece e a escuridão nos ameaça. Nossos pensamentos se aguçam e conseguimos facilmente distinguir o que é realmente importante daquilo que é meramente trivial.

Conversei recentemente com uma mulher que vem lutando contra uma doença grave há dois anos. Ela disse que, antes da doença, seus dias eram cheios de atividades tais como limpar a casa com perfeição e enchê-la de móveis belos. Ia ao cabeleireiro duas vezes por semana e gastava dinheiro e tempo todo mês para adicionar novos vestidos a seu guarda-roupa. Os netos pouco eram convidados a visitá-la, porque sempre se preocupava achando que aquilo que considerava ser seus preciosos bens poderia quebrar-se ou estragar-se nas mãozinhas descuidadas deles.

Então, recebeu a chocante notícia de que sua vida corria risco e que talvez lhe restasse pouco tempo aqui. No momento em que ouviu o diagnóstico do médico, ela soube de imediato que passaria todo o tempo que lhe restasse de vida com a família e os amigos, tendo o evangelho no centro de sua vida, porque era isso que considerava mais precioso.

Esses momentos de clareza chegam na vida de todos, uma hora ou outra, embora nem sempre de modo tão drástico. Vemos com clareza o que realmente importa na vida e como deveríamos estar conduzindo nossa vida.

O Salvador disse:

“Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam;

Mas ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam.

Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração”.1

Em nossos momentos de mais profunda reflexão ou de maior necessidade, a alma do homem se volta para o céu, buscando uma resposta divina para as maiores perguntas da vida: De onde viemos? Por que estamos aqui? Para onde iremos quando partirmos desta vida?

A resposta a essas perguntas não se descobre folheando as páginas de livros acadêmicos ou pesquisando. Essas perguntas transcendem a mortalidade. Elas abrangem a eternidade.

De onde viemos? Essa é a dúvida inevitável, mesmo que não expressa, de todo ser humano que tem a consciência de ter existido antes desta vida mortal.

O Apóstolo Paulo disse aos atenienses, no Areópago, que somos “geração de Deus”.2 Sabendo que nosso corpo físico foi gerado por nossos pais mortais, temos de explorar o significado da declaração de Paulo. O Senhor declarou que “o espírito e o corpo são a alma do homem”.3 Portanto, o espírito é que foi gerado por Deus. O autor de Hebreus O chama de “Pai dos espíritos”.4 O espírito de cada homem e de cada mulher é literalmente um filho e uma filha “gerados para Deus”.5

Vemos que poetas inspirados, ao refletir sobre o assunto, deixaram mensagens tocantes e registraram pensamentos transcendentais. William Wordsworth escreveu esta verdade:

Nosso nascimento é apenas um sono e um esquecimento;
A alma que surge conosco, nossa Estrela da vida,
Teve outro lugar para habitar,
E veio de longe;
Não em total esquecimento
Nem em completa nudez,
Mas seguindo nuvens de glória, viemos
De Deus, que é nosso lar!
O céu nos circunda em nossa infância!6

Os pais ponderam sua responsabilidade de ensinar, inspirar e orientar os filhos e ser-lhes um exemplo. Enquanto isso, os filhos, particularmente os jovens, fazem a pungente pergunta: “Por que estamos aqui?” Geralmente, ela é feita em silêncio no fundo da alma e é formulada desta maneira: “Por que eu estou aqui?”

Quão gratos devemos ser por sabermos que um sábio Criador criou a Terra e nos colocou aqui, esquecidos de nossa existência pré-mortal, para que passássemos por um período de provação, uma oportunidade de provar-nos, a fim de nos qualificar para tudo o que Deus preparou para nós.

Está claro que o propósito primordial de nossa existência aqui na Terra é obter um corpo de carne e ossos. Também nos foi concedida a dádiva do arbítrio. De inúmeras maneiras, temos o privilégio de escolher por nós mesmos. Estamos aqui para aprender na árdua escola da experiência. Discernimos o bem do mal. Diferenciamos o amargo do doce. Descobrimos quais são as consequências associadas a nossas ações.

Pela obediência aos mandamentos de Deus, podemos qualificar-nos para a “casa” mencionada por Jesus, ao declarar: “Na casa de meu Pai há muitas moradas. (…) Vou preparar-vos lugar (…) para que onde eu estiver estejais vós também”.7

Embora venhamos à imortalidade “seguindo nuvens de glória”, a vida segue, inexoravelmente, seu curso. A juventude vem após a infância e a maturidade chega quase imperceptivelmente. Adquirimos pela experiência a necessidade que temos de buscar a assistência dos céus ao seguirmos nosso caminho pela vida.

Deus, nosso Pai, e Jesus Cristo, nosso Senhor, demarcaram o caminho para a perfeição. Eles nos chamam para que escolhamos as verdades eternas e nos tornemos perfeitos como Eles são perfeitos.8

O Apóstolo Paulo comparou a vida a uma corrida com uma meta claramente definida. Exortou os hebreus, dizendo: “Deixemos (…) o pecado que tão de perto nos rodeia, e corramos com paciência a carreira que nos está proposta”.9

Em nosso zelo, não esqueçamos o sábio conselho de Eclesiastes: “Não é dos ligeiros a carreira, nem dos fortes a batalha”.10 Na verdade, o prêmio pertence à pessoa que persevera até o fim.

Ao refletir sobre a corrida da vida, lembro-me de outra corrida dos meus tempos de criança. Meus amigos e eu esculpíamos a canivete pequenos barcos de brinquedo com a madeira macia de um salgueiro. Com uma vela triangular de pano, lançávamos nossas toscas embarcações em uma corrida nas águas relativamente turbulentas do Rio Provo aqui em Utah. Corríamos ao longo da margem do rio e víamos os barquinhos sendo, às vezes, sacudidos violentamente na rápida correnteza, e às vezes, navegando serenamente quando o rio ficava mais profundo.

Numa daquelas corridas, vimos que um barco liderava os demais na direção da linha de chegada. De repente, a correnteza o arrastou para muito perto de um grande redemoinho, e o barco adernou e emborcou. Ficou ali girando e girando, sem poder voltar à corrente principal. Por fim, foi parar no fundo do redemoinho, no meio de restos e destroços, preso pelos tentáculos ávidos do musgo verde.

Os barquinhos de brinquedo da minha infância não tinham quilha para estabilizá-los, leme para guiá-los, nem fonte de força. Seu destino inevitável era rio abaixo: a trilha com menor resistência.

Ao contrário dos barcos de brinquedo, fomos abençoados com atributos divinos para guiar nossa jornada. Não viemos à mortalidade para flutuar ao sabor das correntes da vida, mas com a capacidade de pensar, raciocinar e realizar.

Nosso Pai Celestial não nos lançou em nossa jornada eterna sem preparar meios pelos quais pudéssemos receber orientação para garantir nosso retorno seguro. Refiro-me à oração. Refiro-me também ao sussurro da voz mansa e delicada; sem esquecer as santas escrituras, que contêm a palavra do Senhor e as palavras dos profetas, dadas a nós para ajudar-nos a cruzar com sucesso a linha de chegada.

Em algum momento de nossa missão mortal, surge o passo vacilante, o sorriso abatido, as dores da doença, sim, o final do verão, a aproximação do outono, o frio do inverno e a transição que chamamos de morte.

Toda pessoa ponderada já se fez a pergunta tão bem expressa por Jó, no passado: “Morrendo o homem, porventura tornará a viver?”11 Por mais que tentemos afastar essa pergunta do pensamento, ela sempre volta. A morte chega para todos os seres humanos. Chega para os idosos que caminham com passos vacilantes. Seu chamado é ouvido por aqueles que mal venceram a metade da jornada da vida. Às vezes, silencia o riso de criancinhas.

E quanto à vida após a morte? Seria a morte o fim de tudo? Robert Blatchford, em seu livro God and My Neighbor [Deus e Meu Próximo], atacou vigorosamente crenças cristãs como Deus, Cristo, oração e, em especial, a imortalidade. Ele audaciosamente afirmou que a morte era o fim de nossa existência e que ninguém era capaz de provar o contrário. Foi então que algo surpreendente aconteceu. Sua muralha de ceticismo veio abaixo, deixando-o exposto e indefeso. Aos poucos ele começou a sentir seu retorno à fé que ridicularizara e abandonara. O que causou tamanha mudança em sua perspectiva? A morte de sua esposa. Com o coração partido ele entrou no aposento onde estava o que restara dela e olhou novamente para a face de quem ele tanto amou. Ao sair, disse a um amigo: “É ela, mas ao mesmo tempo, não é. Tudo mudou. Algo que antes havia ali foi levado. Ela não é a mesma. O que pode tê-la deixado senão sua alma?”

Mais tarde ele escreveu: “A morte não é o que alguns imaginam. É apenas como se alguém tivesse passado para outro aposento. Nesse outro aposento encontraremos (…) os amados homens e mulheres e as amáveis crianças que amávamos e perdemos”.12

Irmãos e irmãs, sabemos que a morte não é o fim. Essa verdade tem sido ensinada por profetas vivos em todas as épocas. Também se encontra nas sagradas escrituras. No Livro de Mórmon lemos estas palavras específicas e consoladoras:

“Ora, com relação ao estado da alma entre a morte e a ressurreição — eis que me foi dado saber por um anjo que o espírito de todos os homens, logo que deixa este corpo mortal, sim, o espírito de todos os homens, sejam eles bons ou maus, é levado de volta para aquele Deus que lhes deu vida.

E então acontecerá que o espírito daqueles que são justos será recebido num estado de felicidade, que é chamado paraíso, um estado de descanso, um estado de paz, onde descansará de todas as suas aflições e de todos os seus cuidados e tristezas”.13

Depois que o Salvador foi crucificado e após Seu corpo ter permanecido no sepulcro por três dias, o espírito voltou a entrar Nele. A pedra foi rolada e o Redentor ressuscitado dali saiu, revestido de um corpo imortal de carne e ossos.

A resposta à pergunta de Jó — “Morrendo o homem, porventura tornará a viver?” — foi dada quando Maria e outras mulheres se aproximaram do sepulcro e viram dois homens com roupas brilhantes, que lhes disseram: “Por que buscais o vivente entre os mortos? Não está aqui, mas ressuscitou”.14

Graças à vitória de Cristo sobre a morte, todos seremos ressuscitados. Essa é a redenção da alma. Paulo escreveu: “E há corpos celestes e corpos terrestres, mas uma é a glória dos celestes e outra a dos terrestres”.15

É a glória celestial que buscamos. É na presença de Deus que desejamos habitar. É de uma família eterna que queremos ser membros. Essas bênçãos são alcançadas por meio de uma vida de esforço, de busca, de arrependimento e de sucesso final.

De onde viemos? Por que estamos aqui? Para onde iremos quando partirmos desta vida? Essas perguntas universais não precisam mais ficar sem respostas. Do mais profundo de minha alma e com toda a humildade, testifico que estas coisas de que falei são verdadeiras.

Nosso Pai Celestial Se alegra com aqueles que guardam Seus mandamentos. Também Se preocupa com o filho perdido, o adolescente indolente, o jovem rebelde, o pai ou a mãe delinquente. Na verdade, o Mestre lhes fala, com ternura, dizendo a todos: “Voltem. Subam. Entrem. Voltem para casa. Voltem para mim”.

Dentro de uma semana celebraremos a Páscoa. Nossos pensamentos se voltarão para a vida do Salvador, para Sua morte e Sua Ressurreição. Como Sua testemunha especial, testifico que Ele vive e que aguarda nosso retorno triunfante.

Que possamos retornar, é minha humilde oração em Seu santo nome, sim, Jesus Cristo, nosso Salvador e nosso Redentor. Amém.



Referências:

6.William Wordsworth, “Ode: Intimations of Immortality from Recollections of Early Childhood”, 1884, pp.23–24.
12.Ver Robert Blatchford, More Things in Heaven and Earth: Adventures in Quest of a Soul, 1925, p.11